segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Pela estrada rumo aos Andes

Coluna publicada no Jornal Página 20 | 31out2010


Escrito por Por Fernanda Birolo


Apesar da proximidade geográfica, somente nestes últimos anos nós brasileiros, e especialmente os acreanos, estamos de fato nos “acercando” do vizinho Peru. No turismo, grandes facilidades surgiram recentemente, com uma linha regular de ônibus que sai de Rio Branco rumo ao país andino, e a partir deste ano também um voo internacional que liga a capital do Acre à do Peru (Lima) e à capital do Império Inca (Cuzco).
Mas aos mais aventureiros não se pode negar que o melhor caminho é mesmo pela estrada. Desfrutar das belíssimas paisagens, deixar que o corpo se adapte lentamente ao clima e apreciar a passagem da planície amazônica para as montanhas faz valer todo esforço de uma longa viagem.
Saindo de Rio Branco, no Acre, são 1.130 quilômetros de estrada até Cuzco, num passeio que dura quase dois dias. A primeira etapa do trajeto é em território brasileiro, até a pequena cidade de Assis Brasil. Este é o ponto de fronteira entre os dois países, onde se chega pela BR-317, percorrendo 344 quilômetros desde a capital. Daí em diante se ingressa na Amazônia peruana.
Um pernoite pelo caminho é obrigatório para uma viagem segura, e a cidade de Puerto Maldonado, a 230 quilômetros da fronteira, é o local mais apropriado. Até lá a estrada é completamente asfaltada, e enquanto a ponte da cidade não está terminada, a travessia do rio Madre de Dios é feita em balsas - pequenas ou grandes, a gosto do freguês.
Chegando cedo a Maldonado, é grande a tentação de seguir a viagem, pela curiosidade e para se sentir mais perto do destino. E aí o viajante desprevenido pode ter surpresas, pois não encontrará mais um local com boa estrutura no caminho. A melhor pedida é ficar, experimentar uma deliciosa pizza peruana e ter um bom descanso para os desafios do dia seguinte.


Chegando às montanhas
Após cruzar a fronteira, as pessoas, as casas, os costumes já nos deixam visível que estamos em outro país. Mas é depois de Puerto Maldonado que se começa a perceber as mudanças de paisagem. Aos poucos aparecem as subidas, e logo o corpo sente que a altitude aumenta.

Em apenas um dia, saímos de cerca de 200 metros acima do nível do mar e chegamos a quase cinco mil metros, na passagem pelo ponto mais alto da estrada, próximo à pequena cidade de Marcapata. Essa enorme variação é um convite para o chamado “soroche”, ou “mal da altitude”, que aos pouco acostumados provoca dores de cabeça, tontura, dificuldade na respiração, e até mesmo uma certa “lentidão” no raciocínio.

Mas séculos antes de nós os moradores dos Andes já conheciam uma boa solução para esse mal. Nas cidades e vilarejos do caminho se podem comprar, a baixo preço, saquinhos deste remédio. A folha de coca (que não é droga), colocada na boca para que seu sumo seja ingerido aos poucos, traz quase como milagre um alívio desses sintomas. Não à toa já era considerada planta sagrada pelos Incas.
Além dos nossos corpos, também os equipamentos percebem a diferença da altitude e do frio que vai aumentando. Máquinas fotográficas, filmadoras e até mesmo o veículo pode manifestar algum “desagrado” com o novo clima. Também os produtos embalados como cremes, desodorantes e perfumes sentem a pressão, e podem chegar a vazar. Mas isso não chega a ser razão para preocupação, e sim para estar atento aos efeitos.


Nas curvas do caminho
O melhor programa no passeio é admirar as paisagens. As imagens vistas a cada curva parecem pintura à mão, feitas com todo capricho. Rebanhos de ovelhas e lhamas lembram imagens de filmes. E os picos nevados, tão próximos, fazem parecer que estamos, talvez, noutro continente.

Mas quando as montanhas se aproximam, aí está uma boa razão para ficar em estado de alerta. Misturadas à exuberância dos Andes, as curvas da estrada viram parte da beleza das paisagens, e, por outro lado, representam também o perigo maior da viagem, exigindo uma velocidade reduzida e muita atenção do condutor.

A estrada, no seu trecho peruano, está quase concluída, e é de uma qualidade incomparável mesmo às melhores rodovias brasileiras. Uma espessa e consistente camada de asfalto, boa proteção na beira das montanhas e adequada sinalização trazem mais segurança aos viajantes que por ali passam.

Alguns trechos ainda estão em obras, e os trabalhos correm dia e noite quase sem parar. Mesmo quando o sol se põe, gigantes holofotes iluminam os locais para que os trabalhadores possam continuar seu serviço. E há sempre o risco de se deparar com uma paralisação no caminho, quando alguns trechos são interditados, de dia, até mesmo durante horas. Então é preciso reajustar os planos de horários, e paciência para esperar.

Não havendo nenhum imprevisto, a viagem de Puerto Maldonado a Cuzco, sem pressa e com paradas para contemplar as paisagens, dura de dez a doze horas. Saindo cedo da manhã, é possível chegar em tempo de apreciar o deslumbrante pôr-do-sol por entre as montanhas. E afinal, entrar em Cuzco e ver suas luzes e seu encanto renova as energias para seguir desfrutando de tantas outras maravilhas do Peru.


E meu carro chega lá?
Muita gente ainda acha que só carro grande e com tração é capaz de enfrentar o desafio de subir os Andes. Engano. E digo por experiência: chegamos tranquilamente a Cuzco em um carro de passeio, motor 1.6. Na estrada, mesmo nos desvios e nos trechos que ainda não estão prontos, já não há motivos para temer.
Preocupação com o veículo deve ser para a entrada no país. Uma série de papéis é exigida na fronteira, como documento do veículo, carteira internacional de motorista do condutor, autorização autenticada do proprietário para que o condutor entre no país com seu veículo - no caso de não ir em carro próprio - e, claro, o passaporte ou outro documento apresentado na entrada do país. 





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