quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Índia Quéchua é ministra na Bolívia

Durante a II Feira Panamazônia de Economia Solidária realizada em Rio Branco (AC) no período de 19 a 24 de outubro, e que contou com a participação de oito paises latino-americanos e 300 expositores, a ministra boliviana Antônia Medrano chamou atenção por sua simpatia e engajamento na política de economia solidária. Na ocasião, a jornalista Onides Bonaccorsi Queiroz a entrevistou para o jornalzinho da Prefeitura, Meu Lugar, escrevendo o belo texto abaixo:

Meu doutorado é a vida

*Onides Bonaccorsi Queiroz

Ao chegar ao Seminário Latinoamericano de Economia Solidária, evento integrante da Feira Panamazônia, tratei de perguntar sobre a ministra boliviana ali presente e minha informante, da coordenação do evento, foi muito clara:
– Está na lá na frente do auditório, vestindo uma blusa branca com flores coloridas. É uma pessoa bem agradável.
Dirigi-me ao espaço, alcancei a primeira fila e foi fácil localizá-la: era clara e trajava um vestido simples e charmoso, com o toque artesanal de bordados coloridos, que me pareceu perfeito para a ocasião, dada a tônica do evento e adequado à função que exerce, estritamente relacionada com a economia informal. “Mirna se enganou.” – pensei. “A roupa dela é bege. Mas tem florzinhas mesmo.” Dirigi-me, então, a essa mulher e perguntei:
– A senhora é Antonia Medrano?
– Não. É esta – e apontou para o seu lado direito.
Quase caí de costas com o susto: a ministra era uma índia quechua, com traje típico, de chapéu e tudo! Por essa eu não esperava.
Ai, que gafe! Em fração de segundos, tentei argumentar, comigo mesma, que o que causara o engano foram as tais florzinhas. Mas o olhar da mulher para mim, que assistiu a toda a cena impassível, era tão digno e transparente, que eu desisti de mentir. E admiti internamente: sem querer, exerci o preconceito. “Uma mulher do povo não pode ser ministra”, era a crença gravada na minha mente.
Então aceitei a minha falha. E reagi. Pedi licença para entrevistá-la, consentiu. Pareceu-me mesmo que já estava acostumada com esse tipo de confusão, o que confirmei mais tarde, com pelo menos duas pessoas que caíram na mesma cilada que eu. Atendeu-me com atenção e gentileza. Quando começou a falar, com muita firmeza e propriedade, compreendi que ela tinha tanta consciência de sua identidade, que um ato de  discriminação qualquer não afetava sua segurança. Senti-me, de certa forma, perdoada.
E fiquei ainda mais curiosa de conhecer sua história. Contou-me que nasceu no campo, na localidade de Duraznos, e ali viveu, como lavradora, até os 11 anos de idade. Depois foi para Potosí, trabalhar como empregada doméstica. Casou-se aos 21, quando aprendeu a fazer artesanato têxtil. Foi então que começou a se envolver com movimentos sociais, sobretudo com mulheres e geração de renda. “Sempre quis aprender e ensinar”, diz ela. Tarefa que não fluía com tanta naturalidade, pois eram os anos setenta, de “gobierno muy duro”, relata. Mas foi dessa forma exposta a injustiças sociais gritantes que forjou seu caráter de batalhadora incansável pelos direitos do povo.
Pouco mais tarde, o marido a abandonou com três filhos pequenos, o que tornou sua tarefa ainda mais árdua. Ainda assim fundou, em 1989, a Associação Artesanal Boliviana Senhor de Maio, de economia solidária.
Criou os filhos, formou-os; Juan Carlos é engenheiro agrônomo, Benjamín é técnico superior em eletricidade e Miguel Ángel, dentista. Tem quatro netos: “un varón y tres mujeres”.
Em 2007, elegeu-se vereadora por La Paz. Angariou ainda mais visibilidade e em janeiro deste ano foi empossada Ministra do Desenvolvimento Produtivo e Economia Plural da Bolívia pelo presidente Evo Morales.
Sabe que alcançou o elevado cargo devido ao valor supremo da sua experiência: “o meu doutorado é a vida”. Trabalha muito. Marca reuniões com os líderes dos movimentos sociais às 5 da manhã, o único horário livre que tem. Mostra-se profundamente tocada com o problema da fome, e no seu discurso comove os presentes.
Quando fala de sua infância, vê-se o que a impele a ser tão verdadeira e forte. Pequena, chegava a passar dois ou três dias sem comer e conta que seu estômago doía de fome. Diz, também, que quando era doméstica, davam-lhe “qualquer coisa para comer”. As experiências terríveis, como não poderia deixar de ser, marcaram-na profundamente. Por isso entende que o mais fundamental dos direitos sociais é o de comer.
De minha parte, declaro que aprendi, ou pelo menos comecei a aprender a minha lição, que, a bem da verdade, é a lição de todos os seres humanos. E tem implicações diretas sobre a economia. Já passa da hora de cada um se responsabilizar, pessoalmente, em abandonar os velhos modelos centralizadores e autoritários, o orgulho, a cobiça, o individualismo. Está na hora de saltar para a instância coletiva. Para a cooperação e compartilhamento, atitudes que ainda podem salvar o planeta, a que Antonia chama tão carinhosamente de “Madre Tierra”. Está na hora da economia solidária.

* A jornalista Onides Bonaccorsi Queiroz nasceu no Paraná, mas vive em Rio Branco, Acre, desde 2010. Escreve semanalmente no jornalzinho Meu Lugar, da Prefeitura e assina o blog verbodeligacao.wordpress.com onde expressa forte sabor de literatura.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A Amazônia precisa de cientistas


Ao abrir, na manhã de segunda-feira (18) em Rio Branco, Acre, a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, o cientista Ennio Candotti, presidente de Honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) criticou e ironizou o Ministério de Ciência e Tecnologia, o CNPq e outros órgãos responsáveis pelo desenvolvimento científico e tecnológico da Amazônia. Ele disse que “ não haverá paz nem sustentabilidade enquanto não se questionar os modos atuais de intervenção na natureza”.

Ao responder à pergunta da platéia - constituída, principalmente, de estudantes de níveis médio e universitário, - sobre o que fazer se os órgãos de ciência continuam com olhar torto para a Amazônia, Candotti, que é biólogo e atualmente comanda experiência de vanguarda no Museu da Amazônia (MUSA), de Manaus, respondeu com ironia: “ Talvez tenhamos que pressionar com tanques de guerra”!

O cientista declarou ser imprescindível que planejadores e pesquisadores aprendam a conciliar o conhecimento científico com o conhecimento dos que vivem na floresta; do contrário, os programas de desenvolvimento regional com o rótulo da sustentabilidade se limitarão a retirar da região, de forma sempre predadora, apenas o que já é conhecido dos mercados.

Ennio Candotti recomendou aos jovens que sejam curiosos e não aceitem qualquer proposta de desenvolvimento para a Amazônia. Ilustrou sua preocupação informando que em Coari, no Estado Amazonas, a Petrobrás explora petróleo, mas a 10 quilômetros de lá tem uma aldeia indígena que vive na extrema miséria. “ A ciência - enfatizou, - não fará sentido se não ajudar acabar com a miséria humana”.

Os futuros cientistas, segundo Ennio Candotti, deverão aprender a conversar com as formigas e as onças se quiserem entender de verdade a Amazônia. As formigas, explicou, não têm celular nem GPS, mas se comunicam em rede e se juntam com incrível rapidez para carregar migalhas de pão deixadas sobre uma mesa. Esta é uma ciência que os que vivem na floresta parecem mais próximos de entender, embora enfrentando discriminação e ceticismo dos acadêmicos.

A índia Taiza, de 12 anos, do grupo indígena a Saterê Awé, sofreu constrangimento numa escola amazonense de não-índios por declarar numa redação que gostaria de ser “ farinheira” . Os professores e alunos riram e debocharam dela que, entretanto, tinha argumento forte: queria aprender a fazer farinha para não deixar que os membros de sua tribo viessem a passar fome. “ Saber fazer” , inclusive farinha é muito importante, disse o cientista, e ser “ farinheira” de profissão também.

A riqueza gerada na Amazônia pode ser enorme e socialmente justa, desde que a região não seja explorada como depósito de coisas conhecidas dos mercados. Que não tenha que vender preferencialmente petróleo, madeira (mesmo certificada) ou Carbono (porque está na moda). “ Não é possível que uma floresta que tem uma diversificada e rica microbiologia não tenha produtos mais interessantes a oferecer” – disse Candotti, exemplificando: “ Só o veneno de uma aranha vale mais que todo as árvores existentes em 1 hectare da floresta” . Os óleos e as informações que estão la no meio da floresta valem milhões de dólares.

Entretanto, a regiâo precisa contar com pesquisa científica e com tecnologia. O ideal, segundo Candotti, é que 300 a 400 mil cientistas pudessem estar pesquisando cada quilômetro quadrado da região, na atualidade. “ E as instituições de pesquisa, bem como os órgãos de planejamento não podem continuar subestimando o conhecimento dos que vivem na floresta”.

domingo, 17 de outubro de 2010

Lula: o amigo do Acre

Coluna publicada no Jornal Página 20 | 17out2010
Em dezembro de 1988, Lula discursa junto ao caixão de Chico Mendes, no velório dentro da igreja de Xapuri

Ainda como líder metalúrgico na região do ABC paulista, em fins dos anos 70, Luís Inácio Lula da Silva começou sua amizade com o Acre. De lá para cá, nunca deixou de participar dos acontecimentos sindicais e políticos que marcaram mudanças fundamentais na vida dos acreanos. Ele já fez 15 visitas ao estado como sindicalista, deputado federal e como Presidente da República.

Em julho de 1980 participou em Brasiléia, na fronteira com a Bolívia, de um ato de protesto pelo assassinato do presidente do sindicato dos Trabalhadores Rurais Wilson Pinheiro, de tocaia, dia 21, a mando de fazendeiros. Ao discursar de um palanque improvisado na carroceria de um caminhão, Lula declarou:
“Está na hora da onça beber água”!

O recado foi entendido pelos companheiros de Wilson que, ao retornarem para suas colocações de seringa toparam no caminho com o capataz da Fazenda Nova Promissão, Nilo Sérgio, principal suspeito do crime, e meteram bala nele. O caldo engrossou e mais de 40 seringueiros foram presos pela Polícia Militar enquanto Lula e outras lideranças como Chico Mendes e o delegado regional da Contag, João Maia, foram enquadrados na Lei de Segurança Nacional do regime militar.

No dia 22 de dezembro de 1988, Chico Mendes foi morto em condições semelhantes pelo peão Darcy Alves a mando do pai fazendeiro Darli. Desta vez, Lula, na condição de deputado federal (PT) fez longo e polêmico discurso dentro da Igreja de Xapuri, ao lado do caixão do líder seringueiro durante o velório.

Como diretor da precária TV Aldeia (TV Educativa) na época, encaminhei a gravação em fita Umatic. Nas eleições de 1990 para o Governo do Estado, o candidato Edmundo Pinto, do PDS (partido antecessor do DEM, hoje parceiro do candidato José Serra), ganhou do estreante Jorge Viana (PT) no segundo turno. Preocupado com o destino que seria dado à fita na nova administração, favorável aos fazendeiros, tomei o cuidado de fazer cópia e levar comigo para o Amapá, onde vivi 13 anos, como assessor do governador Joào Alberto Capiberibe (1995-2002) e editor do jornal Folha do Amapá.

De volta ao Acre, em 2003, consegui fazer uma cópia digital dessa e de outras 33 fitas que passei para o acervo da Biblioteca da Floresta em 2008.

Agora, 22 anos depois, estou tornando público o conteúdo dessa fala histórica que marca a relação também histórica do atual Presidente com o Acre, desde aqueles tempos tristes.


Discurso no velório (1988):


O Chico termina numa entrevista que ele deu ao jornal do Brasil dizendo o seguinte: “Eu quero ficar vivo para ajudar a salvar a Amazônia, eu não quero morrer, porque esse negócio de ato público depois da morte, esse negócio de grandes enterros acaba no dia seguinte”. Esse era o pensamento do velho Chico, há tempo, pois ele participou junto comigo do ato de solidariedade ao companheiro Wilson Pinheiro, morto em Brasiléia dento do sindicato em 21 de julho de 1980, e falou isso (...).

Chico conseguiu juntar a bandeira do direito ao trabalho, do direito à vida dos trabalhadores desse Estado e dessa região com uma luta pela defesa do meio ambiente. Por quê? Porque preservar o meio ambiente para os trabalhadores que moram na região amazônica, preservar as árvores, preservar as castanheiras, preservar as seringueiras é, na verdade, preservar o direito do feijão e do arroz de cada criança dessa região. Porque o gado traz riqueza pro dono do gado, mas não traz sequer carne para os companheiros que trabalham aqui. E o que o companheiro Chico queria? Ele queria pura e simplesmente que deixassem a mata, que era instrumento de sobrevivência de milhares e milhares de trabalhadores, em paz; que fossem plantar gado noutro lugar, criar gado noutro lugar, mas deixassem aqui a mata, as seringueiras, as castanheiras, pros trabalhadores sobreviverem.

Na TV Globo o doutor Romeu Thuma, a quem o Chico enviou várias cartas, dizia o quê? Que a culpa do que está acontecendo aqui é da Polícia Militar... Mas nós precisamos dizer que a culpa não é apenas da polícia militar, a culpa é de todos eles juntos: é da polícia federal, é da polícia militar, da justiça brasileira, da Presidência da República (José Sarney- PMDB), porque, quando eles inventam que vêm aqui desarmar o povo, quem que eles desarmam? Eles pegam a espingardinha de caçar preá do trabalhador e deixam os fazendeiros com metralhadoras, calibre 12.

O companheiro Chico não ganhou as eleições (Chico foi candidato a deputado estadual em 1982 e a prefeito de Xapuri em 1985) e alguns imaginavam que a partir daí fosse desanimar. Qual não foi a surpresa dele: ao invés de desanimar, a luta do companheiro Chico ganhou outra dimensão; ele começou a ser reconhecido por organismos internacionais, pelo Banco Mundial, pelo BID, pelo movimento ecológico do mundo inteiro; começou a ser reconhecido, a ganhar prêmio, a viajar e a contar no mundo o que acontecia aqui; e começou inclusive a dar palpite, opinião sobre empréstimos que empresas estrangeiras ou bancos estatais iam fazer aqui, e por isso aumentou o ódio dos grandes proprietários contra o companheiro Chico. Aumentou o ódio a ponto de culminar com a morte dele no dia 22.

O quê que essas pessoas imaginam? Será que essas pessoas são tão burras que imaginam que matando Chico Mendes, mataram a luta do Chico Mendes? Será que eles não percebem (aplausos), será que esses ricos não têm exemplo na história, será que eles não percebem que esse mesmos grupos de ricos mandaram matar Jesus Cristo há dois mil anos atrás? E o povo não esqueceu as idéias de Jesus Cristo. Será que esses mesmos não estão lembrados que foram eles que mandaram matar Tiradentes, esquartejar e colocar sua carne pendurada nos postes, para que o povo nunca mais se lembrasse quem era Tirandentes? 30 anos depois o Brasil conquistou sua independência.

Eu queria dizer pra vocês uma coisa bem simples, pra cada um de vocês guardar na cabeça. Vocês conheciam bem o caboclo Chico, vocês sabiam bem o que Chico queria, vocês sabiam o que Chico dizia, vocês sabiam o que o Chico pensava. Pois bem, o que o companheiro Chico, que deve estar no céu nesse instante, espera de cada um? Ele espera que aumente a coragem e a disposição de luta de cada companheiro. Ele dizia sempre: no dia em que eu morrer meus companheiros vão se dobrar, cada um vai valer por 10 e a luta vai continuar. E é isso que tem que acontecer (aplausos). Porque se agora houver por parte dos trabalhadores e de todos nós, medo e preocupação, o quê que vai acontecer? Eles vão ficar rindo da vida e vão matar mais. O quê que nós deveremos esperar? Em primeiro lugar, nós achamos que o povo brasileiro quer justiça, e que a polícia prenda esses assassinos do companheiro Chico.

Se é verdade que esses dois sujeitos (Darli e Alvarino Alves) tinham 30 mil hectares aqui; se é verdade que eles eram bandidos em Minas e no Paraná e já vieram fugidos; se é verdade que aqui eles ficaram contratando grileiros e já mataram mais de um trabalhador, e se é verdade que essa propriedade deles pode até ser grilada... O quê que deveria acontecer como atitude nobre do governo? O governo deveria desapropriar essa terra e dar para os trabalhadores rurais cultivarem, ao invés de deixá-las ficar nas mãos de bandidos e grileiros; porque, se o governo fizesse isso e cada fazendeiro que manda matar alguém perdesse sua terra, na verdade essas pessoas iriam ter medo de continuar matando trabalhador rural (...).

Nós precisamos dizer em alto e bom som: o governo precisa começar a investigar cada crime colocando policiais sérios pra fazer isso, porque nós sabemos que tem muitos policiais que são capachos de fazendeiros (aplausos) na cidade. É preciso que haja seriedade e vocês sabem, companheiros, pra terminar, que cada um de nós, tanto nós de São Paulo, como companheiros do Acre, de Rondônia, que chegaram aqui agora, sabemos que temos um compromisso sério: é não deixar a coisa agora esfriar, é não deixar, sabe, o que eles querem, que o povo esqueça o companheiro Chico Mendes.

Agora é que nós temos que mostrar pra eles que nós vamos fazer a luta do companheiro Chico Mendes ser conhecida nesse país. Agora que vamos arrumar solidariedade, não apenas pra dar sobrevivência para a companheira do Chico e de seus filhos, mas arrumar solidariedade pra dar ajuda concreta à luta dos trabalhadores que defendem a Amazônia, a luta dos trabalhadores que defendem o seringal, a luta dos trabalhadores que defendem a manutenção das castanheiras e a luta dos trabalhadores que brigam por reforma agrária.

A classe dominante tá ficando com medo, porque ela sabe que a classe trabalhadora tá amadurecendo; ela sabe que a classe trabalhadora tá tomando consciência, ela sabe que aqui hoje tá PV, PT, daqui a pouco chegam companheiros do PMDB, daqui a pouco chegam do PDT, sei lá, o movimento sindical... Ela sabe que tá crescendo a solidariedade e começa a ficar com medo.

Eu acho que é um compromisso dos partidos políticos progressistas, do movimento sindical, da CUT, da CGT, que a gente precisa transformar cada palavra do Chico numa profissão de fé por esse país aí afora. Daqui a pouco eles vão perceber que o que Chico falava aqui e era ouvido apenas pelos companheiros do sindicato dele vai ser discutido lá no agreste de Pernambuco, lá na Bahia, na favela de São Paulo (...).

Nós deveremos eleger o Chico, hoje, o símbolo da descrença desse governo, deveremos eleger o companheiro Chico hoje como o mártir da classe trabalhadora camponesa desse país, porque o que ele fez foi dedicar 44 anos da sua vida à luta pela liberdade dos trabalhadores.

A morte do Chico não foi o fim, ela foi o início da libertação da classe trabalhadora brasileira.

domingo, 10 de outubro de 2010

Luis Jorge Salinas

E-mail enviado ao blog:


Estimado Elson:
Estive lendo seu blog na nota soubre o mapinguari ,him quero comentar vc que eu sou testigo desses animais,acredite que e real.
recentemente fiz um livro relatando issos avistamentos e 3 expediçoes que fiz nos ultimos anos ate com apoio do biologo da tv Richard Rasmussen com quem fiz uma grande amistade e acredita
na existencia deles.
pode olhar meu blog informativo das minhas concluciones www.luisjorgesalinas.blogspot.com
tambem tenho atualizado contato com David Oren quem ja tem meu livro .
Mando um abrazo
Luis Jorge Salinas-Explorador

domingo, 3 de outubro de 2010

Escolha ideológica

Coluna publicada no Jornal Página 20 | 3out2010

Ilustração da ditadura militar brasileira de 1964, publicada na coleção Retrado do Brasil pelos jornalistas Mino Carta e Raimundo Rodriges Pereira
Jânio Quadros foi o meu primeiro voto e também minha primeira decepção política. Em 3 de outubro de 1960, portanto há 50 anos, me tornei um dos 5,6 milhões de eleitores brasileiros que o elegeram Presidente do Brasil pela UDN. Em Seis meses de mandato, entretanto, ele só se destacou por ter proibido o biquíni e adotado o uniforme cubano para os funcionários públicos federais... Por fim, renunciou dizendo-se pressionado por “forças ocultas”.

O vice Jango Goulart, eleito pela coligação PTB-PSD (na época, o vice era escolhido em votação separada), assumiu o posto após agitadas discussões políticas e queda de braço com as forças armadas. Os partidos ou organizações de esquerda formadas por cisão do PCB (Partido Comunista Brasileiro) e PC do B (Partido Comunista do Brasil) tinham como referências revolucionárias, Cuba e China.

Jânio Quadros me convencera ao prometer em campanha eleitoral (pelo rádio) varrer toda a sujeira da administração pública do País. Era populista, bom de discurso, de tal forma que nem percebi que sua vassoura era apenas um brochinho de lapela. Tal qual o broche-espada do principal concorrente, o General Henrique Lott.

Lembrei de meu vacilo nestes últimos dias da campanha política versão 2010 no Acre, ao ver pela televisão uma jovem e bela acreana anunciar que empregará seu primeiro voto para eleger um candidato populista ao Senado. Espero que ela não sofra tanto!

Em 1963, concluí o segundo grau num colégio público do Amapá, para onde me deslocara em 1959, e tomei uma decisão corajosa: larguei o emprego na Vasp para aventurar-me em Belo Horizonte, capital que alimentava meus sonhos. Tinha acabado de ler o livro “Encontro Marcado”, do escritor mineiro Fernando Sabino e queria viver algo parecido por lá. Em janeiro, fiz vestibular e em março comecei a cursar Belas Artes na Escola Guignard, e cinema na Universidade Católica.

Com mais um pouco de sorte, arrumei trabalho aos domingos como redator de notícias da Rádio Inconfidência (do Estado), depois trabalhei também na Rádio Tiradentes (da rede Globo). Nesta última começava de madrugada levantando as ocorrências policiais para o noticioso que ia pro ar às 7 horas.

Ganhava o suficiente para pagar a pensão e a lavagem de roupa, mas não sobrava para o transporte. Meu deslocamento tinha que ser na “pátria amada”. Tudo bem, sonho e coragem não me faltavam. Queria ser crítico de cinema e artista plástico, começara a viver em ambiente universitário freqüentando barzinhos e livrarias. Lia tudo: romances, obras de marxismo, Sartre, Bertrand Russel, Bakunin, biografias... Era um aprendizado rico para um jovem saído das barrancas do seringal Nova Olinda, Rio Iaco, Sena Madureira. Acre.
Mas a alegria durou pouco. Em 31 de março de 1964 os militares deram o golpe demovendo Jango, Brizola e outras lideranças civis do Poder, oficializando a Ditadura. Todas as liberdades foram suprimidas, os trabalhadores e os jovens conscientes se tornaram suspeitos.

Na pensão de dona Osmira no bairro da Floresta, onde eu fazia as refeições, fomos surpreendidos durante o almoço por soldados e agentes do DOPS armados de metralhadora. Todos com as mãos pra cima, encostadas na parede.

Sustos como esse viraram rotina e os sonhos deram lugar à indignação. Timidamente, comecei a me envolver com pessoas que percebiam a anormalidade e se dispunham lutar contra ela. Essa compreensão me veio através dos versos de João Cabral de Melo Neto em “Morte e Vida Severina”: “Muita diferença faz/ entre lutar com as mãos/ ou abandoná-las para trás”. O artista plástico, o critico de cinema e mais tarde o tecnólogo em Química Industrial (curso que aceitei fazer para ter direito a uma bolsa da Sudam) foram aos poucos pro espaço. Sobrou um militante desajeitado, mas disposto a correr riscos.

E nada mais de eleições, e nada mais de liberdade, e nada mais de cidadania. Em 1969, o líder estudantil João Alberto Capiberibe (que foi governador e senador do Amapá nos anos 1990), com atuação no Pará e no Amapá, apareceu em BH arrebanhando pessoas para a luta armada. Tinha conversado com Carlos Marighela, dirigente da ALN (Aliança Libertadora Nacional) em São Paulo, e recebido a missão de ajudar a montar um núcleo de guerrilha no Pará. Eu e o Tito Guimarães Filho, colega de trabalho na Rádio Tiradentes, topamos e saímos os três sem lenço e sem documento, de ônibus, para Belém. Ficamos instalados num “aparelho” no bairro do Marco.

Lá, em contato com outros militantes demonstrei minha insegurança, manifestei discordância e terminei por ser excluído do grupo. Viajei para o Amapá que também acolheu, alguns dias depois, o Tito Guimarães, que tentou antecipar a guerrilha requisitando 100 burros para trabalhadores rurais de São José do Capim e se deu mal. Com a ajuda do padre italiano de esquerda, Caetano Maiello, assumimos a editoria do semanário A Voz Católica e programas na Rádio Educadora, ambos da Prelazia de Macapá. Na Rádio chegamos a produzir o programa “Alguma Coisa Antes que Anoiteça”, diariamente, a partir das 17h30, ensinando princípios marxistas. Mas outro padre nos descobriu e nos afastou do projeto.

Só tivemos tempo de registrar, na capa de A Voz Católica, nossa indignação diante do assassinato de Carlos Marighela pelos militares, em São Paulo, em 1969: “Morreu um grande brasileiro. Assassinado”! E vieram as prisões; do Capiberibe e sua companheira Janete quando tentavam escapar do cerco numa estrada do Maranhão; a do Tito em Belém; e a minha própria, em Macapá com transferência para Belém. Tito foi levado para o Rio Grande do Sul onde ficou preso incomunicável. Capiberibe conseguiu fugir do presídio São José, de Belém, e exilou-se no Chile com a família.

Eu vivi mais tempo cinzento, com liberdade vigiada e sem sonhos. Com mulher e um casal de filhos fui trabalhar como químico de uma indústria de Laticínios em Belém. Em 1974 tive uma recaída: larguei o Lacticínio e me tornei artesão fazendo entalhes em madeira. A barra pesou e voltei ao jornalismo alternativo, até ser contratado, em 1975, pelo jornal O Estado de S. Paulo, primeiro como correspondente no Amapá, depois como repórter regional baseado no Acre, por indicação do jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto, editor do Jornal Pessoal.

Aqui, a partir de 1975 retomei o ânimo no jornal Varadouro e em outras lutas acreanas. E após 30 anos de abstinência, votei novamente para Presidente da República: em 1990 no Lula, mas deu Collor de Mello; em 1994 e 1998, novamente no Lula, mas deu FHC; em 2002 e 2006, finalmente, Lula começou a dar certo.
Agora tenho como opção para Presidente quatro candidatos com perfis de esquerda. O José Serra (PSDB) eu descarto, por seu elitismo paulistano. O Plínio de Arruda Sampaio (PSOL) também descarto, com todo respeito, porque cansei do radicalismo sonhador. A Marina Silva (PV), sobre quem registrei na apresentação do livro “Amapá - Um Norte para o Brasil” que “faz política com a linguagem dos anjos”, deixo sob a responsabilidade dos mais jovens e mais sonhadores (e menos ateus) que eu.

Fico com a Dilma, presa e torturada pelos militares de 1964, porque essa dor eu conheço bem e sei que deve ser honrada. Também porque ela serve ao Projeto Acre ao qual estou entregue de corpo e alma, e ao qual Lula, seu padrinho político está envolvido desde 1978. Desejo um Acre livre dos destruidores de florestas e dos vis amantes do dinheiro.